quarta-feira, 18 de março de 2015

Memorial Do Convento – Linguagem e Estilo
Em Memorial do Convento, torna-se notória a fuga às regras da gramática normativa tradicional na utilização da pontuação, o que confere ao texto fluidez rítmica, aproximando-o do discurso oral ou do ritmo do pensamento. É normalmente a vírgula que separa as falas das personagens. Os pontos de exclamação e de interrogação são omissas, assim como qualquer referência do narrador a estes tipos de entoação, o que, contudo, não impede o leitor de os percecionar. Evidente também é o hibridismo de tipologias discursivas, pois o narrador utiliza os discursos direto, indireto e indireto livre, sem proceder às demarcações tradicionais ao nível gráfico (dois pontos seguidos de travessão) e lexical (recurso aos verbos que introduzem o discurso direto como declarar, perguntar, acrescentar, etc.).

As frases e a ausência de pontuação favorecem a pluralidade de vozes que se observa em Memorial do Convento. Com efeito, a estrutura sintática infringe intencionalmente a norma, prestando-se a leituras que alternam o discurso escrito com o discurso oral e, sobretudo, com um discurso monologado que resulta da mistura de vozes que se produzem no pensamento das personagens.

Várias são as marcas linguísticas e estilísticas: a metáfora, a ironia, a hipálage, as oposições, as frases longas, os paralelismos de construção, a enumeração polissintética, a utilização do registo de língua familiar e popular (com sentido irónico e crítico ou como forma de tradução do estrato social das personagens), utilização do gerúndio, do presente do indicativo, do modo imperativo…

Elementos Simbólicos

Memorial do Convento é uma obra onde podemos encontrar uma enormidade de elementos simbólicos. Para além de objetos, as personagens, os números, os espaços, parece que tudo tem um valor simbólico importantíssimo. Aqui ficam os símbolos e respectivo valor:

  • Convento de Mafra - representa a ostentação régia e o místico religioso. Mas também testemunha a dureza a que o povo está sujeito, a miséria em que vive, a exploração a que é sujeito apesar da riqueza do país;
  • Passarola voadora - simboliza a harmonia entre o sonho e a sua realização, o desejo de liberdade. Permitiu a união entre Bartolomeu Lourenço, Baltasar e Blimunda, que juntaram a ciência, o trabalho artesanal, a magia e a musica para construir e fazer voar a passarola. Símbolo de fraternidade e igualdade capaz de unir os homens cultos e os populares;
  • Blimunda - representa um elemento mágico difícil de explicar: possui poderes sobrenaturais que lhe permite compreender a vida, a morte, o pecado e o amor. Através de Blimunda o narrador tenta entrar dentro da história da época e denunciar a moral duvidosa, os excessos da corte, o materialismo e hipocrisia do clero, as perseguições e injustiças da inquisição, a miséria e diferenças sociais;
  • Número “sete” - é o número de dias de cada ciclo lunar, que regula os ciclos de vida e da morte na Terra. Símbolo de sabedoria e de descanso no fim da criação;
  • Baltasar Sete-Sóis / Blimunda Sete-Luas - o sol símbolo de vida, associa-se ao povo que trabalha incessantemente, como o próprio Baltasar, apesar de decepado. a lua não tem luz própria, depende do sol, tal como Blimunda depende de Baltasar. A lua atravessa fases, o que representa a periodicidade e a renovação;
  • Cobertor - símbolo de afastamento, da separação que marca o casamento de convivência entre o rei e a rainha. Liga-se à frieza do amor, à ausência do prazer, esconde desejos insatisfeitos;
  • Colher - símbolo de aliança, da “união de facto”, de compromisso sagrado. Exprime o amor autêntico numa relação de paixão, a atracção erótica de um casal que desenvolve uma calorosa paixão;
  • Mãe da Pedra- Outra situação-acontecimento de cariz mítico em Memorial do Convento constitui-se com a gesta heroica, epopeica, do transporte da pedra gigante de mármore, a mãe da pedra, de Pêro Pinheiro para Mafra. O tamanho gigantesco da pedra, o carro especialmente construído para o seu transporte, as duzentas juntas de bois e os seiscentos homens necessários para o puxarem, os difíceis obstáculos do caminho, à semelhança das narrativas de heróis clássicos, em que se anunciam os “trabalhos” fabulosos que terão de ser contornados e o esforço imperioso, mais do que humano, que terá de ser despendido.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Categorias da narrativa

Ação

Na acção, o Rei D. JoãoV , Baltasar, Blimunda e Bartolomeu Lourenço protagonizam as diversas acções que se entretecem em Memorial do Convento.
A acção principal é a construção do convento de Mafra. Esta resulta da reinvenção da História pela ficção. Situa-se no inicio do séc. XVIII, encontrado-se enlaçados dados Históricos, como o da promesssa de D. João V de construir um convento em Mafra, e o do sofrimento que nele trabalhou. Percebe-se a situação económica e social do país, os autos de fé praticados pela Inquisição, o sonho e a construção da passarola pelo padre Bartolomeu, as críticas ao comportamento do clero, os casamento da infanta Maria Bárbara e do príncipe D. José.
Em paralelo com a acção principal decorre uma acção que envolve Bartolomeu - Sete Sóis - e Blimunda - Sete Luas -. São estas personagens que estabelecem o fio condutor da intriga e que lhe conferem fragmentos de espiritualidade, de ternura, de misticismo e de magia.
A centralidade conferida ás obras do Convento e aos espaços sociais de Lisboa ou de Mafra dão frequentemente lugar a uma intriga de profunda humanidade trágica. As duas acções voluntariamente surgem em fragmentos que se reconstituem por encaixes vários e recriam situações, costumes, tradições, ambientes e problemas. 

Personagens:

Rei D. João V:

· Rei vaidoso, egocêntrico, megalómano e libertino;
· Rico e poderoso - não sabe o que fazer com tanta riqueza;
· Arrogante - a vontade do rei é divina;
· Tem " medo de morrer";
· É ridicularizado pelo narrador que recorre à caricatura e ao tom irónico na sua descrição.

Baltazar:

·  Homem do povo nascido em Mafra;
·   Não tem a mão esquerda;
·  Tem a alcunha de Sete Sóis;
·   Apaixonado por Blimunda;
·  Sonhador, constrói a Passarola;
·   Morre queimado num auto-de fé (54 anos).

Blimunda:

·  Mulher misteriosa, fiel, intuitiva e inabalável no amor;
·  Possui o dom da vidência, vê o interior dos corpos;
·  Tem a alcunha de Sete Luas;
·  Tem uma sabedoria muito própria, é inteligente.


Padre Bartolomeu de Gusmão:

-Sonhador, visionário e culto;
-Capelão na corte e amigo de D. João V;
-Nascido no Brasil;

· Possui uma visão muito própria da religião pois:
-Abençoa a relação de Baltazar e Blimunda;
-Aceita o dom de Blimunda;
-É muito ligado à ciência.

·  Possui um espírito cientifico que o vai afastando da igreja progressivamente;
· O seu conhecimento e estudos levam-no a interrogar-se acerca dos dogmas católicos;
· Tem medo da Inquisição pois está consciente de que fez coisas condenadas pelo Santo Oficio como, a construção da Passarola;
·   Morre louco em Toledo;



Domenico Scarlatti:

-Músico italiano, nascido em Nápoles;
-Talentoso, culto e sonhador;
-Professor de D. Maria Barbara;
-Trava amizade com o Padre Bartolomeu na corte do rei;
-Tem conhecimento da existência da Passarola e interessa-se pelo engenho;
-A sua música possui um poder curativo e inebriante.




O povo:

-Populares anónimos, analfabetos e oprimidos;
-Trabalhadores humildes;
-Sacrificados e sujeitos à exploração dos poderosos;
-Elevados a herói pelo narrador.


Espaço 


Memorial do Convento apresenta três tipos de espaço: o espaço físico, o espaço social, o espaço psicológico. Espaço Físico: São dois os espaços físicos nos quais se desenrola a acção: Lisboa e Mafra. 

Lisboa- Enquanto macroespaço, integra outros espaços Terreiro do Paço Local onde Baltasar trabalha num açougue, após a sua chegada a Lisboa Rossio Este espaço aparece no início da obra como local onde decorre o auto-de-fé S. Sebastião da Pedreira Espaço relacionado com a passarola do Padre Bartolomeu de Gusmão e com o carácter mítico da máquina voadora 



 Rossio – Auto-de-fé Gravura do séc. XVIII

 O alto da Vela foi o local escolhido para a construção do convento. - Nas imediações da obra, surge a “Ilha da Madeira”, onde começaram por se alojar dez mil trabalhadores, chegando, mais tarde, a quarenta mil. Além de Mafra, são referidos os espaços de Pêro Pinheiro, serra do Barregudo, Monte Junto e Torres Vedras. Nota : as referências ao Alentejo apresentam um espaço povoado de mendigos e de salteadores. Mafra É o segundo macroespaço
Espaço Social – Lisboa e Mafra O espaço social é construído através do relato de determinados momentos e do percurso de personagens que tipificam um determinado grupo social. Destaque:

1- Procissão da Quaresma – caracterização da cidade de Lisboa; excessos praticados durante o Entrudo; penitência física; a descrição da procissão; as manifestações de fé que tocavam a histeria com os penitentes a autoflagelarem-se.
2- Autos-de-fé (Rossio) – entre os autos-de-fé e as touradas, o povo revela gosto sanguinário e emoções fortes; a assistência feminina preocupa-se com os pormenores fúteis e com os jogos de sedução; a morte dos condenados é motivo de festa.  
3- Tourada (Terreiro do Paço) – os touros são torturados, o público exulta com o espectáculo.
4- Procissão do Corpo de Deus – as procissões caracterizam Lisboa como um espaço caótico, cujo ritual tem um efeito exorcizante.
5- O trabalho no Convento – Mafra simboliza o espaço da servidão desumana a que D. João V sujeitou o seu povo (cerca de 40 mil trabalhadores).
6-A miséria do Alentejo – este espaço associa-se à fome e à miséria.


Espaço Psicológico:


-O espaço psicológico é constituído pelo conjunto de elementos que traduz a interioridade das personagens. Revela-se através dos sonhos e dos pensamentos.

Tempo :

O fluir do tempo , mais do que através da recorrência a marcos cronológicos específicos, é sugerido pelas transformações sofridas pelas personagens. - tempo da história (tempo diegético) - tempo do discurso.
Tempo Diegético - Trata-se do tempo histórico em que decorre a acção (1711 a 1730). A acção tem início no ano de 1711 : ”S. Francisco andava pelo mundo, precisamente há quinhentos anos, em mil duzentos e onze…” Datas: 1711 – promessa de construção do convento. 1716 – bênção da primeira pedra. 1717 – Baltasar e Blimunda regressam a Lisboa. 1719 – casamentos de D. José e de Maria Bárbara. 1730 – sagração do convento. 1739 – fim da acção, quando Blimunda vê Baltasar a ser queimado.
Tempo do Discurso - Por tempo do discurso entende-se aquele que se detecta no próprio texto organizado pelo narrador, através da forma como relata os acontecimentos. Pode ser apresentado de forma linear, e ou com recurso a analepses e prolepses. 


O Narrador 




Homodiegético:

·  Fala na 1ªpessoa, dialoga com outras personagens;
·  Ex : o fidalgo do cortejo do casamento dos príncipes (que explica a João Elvas o que se vai passando) e Manuel Milho.

Heterodiegético:

·  Está fora da história que narra;
·  Fala na 3ª pessoa;
·  Descreve, sentencia, profetiza.

--> Em Memorial do Convento, o narrador conta a história com apartes e comentários:

· Com uma voz distanciada e impessoal;
· Com uma voz intemporal, comentando os acontecimentos do passado à luz do presente;
· Apresentando marcas da oralidade;
· Como se estivesse dentro e fora das personagens (omnisciente).

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

D. João V

Dom João V de Portugal, o Magnânimo (22 de Outubro de 1689—31 de Julho de 1750), foi o vigésimo-quarto Rei de Portugal desde 1 de Janeiro de 1707 até à sua morte.

O seu longo reinado de 43 anos foi o mais rico da História de Portugal, profundamente marcado pela descoberta de ouro no Brasil no final do século XVII, cuja produção atingiu o auge precisamente na última década do seu reinado.

A primeira e última década do reinado foram marcadas por guerras:

a Guerra da Sucessão Espanhola, que levara à tomada de Madrid em 1706, e levou à Batalha de Almansa no primeiro ano do seu reinado, e ainda a combates em África, na América, e na Ásia contra os franceses;
mais tarde as campanhas navais contra os turcos no Mediterrâneo, que levaram à vitória na Batalha de Matapão em 1717; e ainda
as guerras que Portugal ao mesmo tempo travava no Oriente, na Arábia e na Índia, contra estados asiáticos, nomeadamente contra o Império Marata e os árabes de Omã.
O longo reinado de D. João V pode de certo modo dividir-se em dois períodos: uma primeira metade em que Portugal teve um papel activo e de algum relevo na política europeia e mundial, e uma segunda metade, a partir da década de 1730, em que a aliança estratégica com a Grã-Bretanha gradualmente assumiu maior importância, e o reino começou a sofrer uma certa estagnação.

Como rei, D. João V sempre tentou projectar Portugal como uma potência de primeira grandeza, principalmente nas primeiras décadas do reinado. Exemplos disso são as faustosas embaixadas que por motivos vários enviou ao imperador Leopoldo I em 1708, a Luís XIV da França em 1715, ao papa Clemente XI em 1716, ou ainda ao Imperador da China em 1725. Outro exemplo foi o litígio que manteve com a Santa Sé na década de 1720, sobre a questão do cardinalato a atribuir ao núncio apostólico na capital portuguesa.

D. João V foi um grande edificador, e dotou principalmente a capital portuguesa de numerosas construções. Fomentou o estudo da história e da língua portuguesa, mas falhou em melhorar de forma significativa as condições da manufactura em Portugal; e gastou a maior parte da sua riqueza nos edifícios que construiu. Por ironia do destino, a maior parte deles desapareceria pouco depois da sua morte, no grande Terramoto de 1755. Os principais testemunhos materiais do seu tempo hoje são, em Portugal, o Palácio Nacional de Mafra, a Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra, o Aqueduto das Águas Livres em Lisboa, e a principal parte da colecção do Museu Nacional dos Coches, talvez a mais importante a nível mundial, também na capital portuguesa. No campo imaterial, merece destaque a extinta Academia Real da História Portuguesa, precursora da actual Academia Portuguesa da História, e ainda a criação do Patriarcado de Lisboa, um dos três patriarcados do Ocidente da Igreja Católica.

O último feito diplomático do reinado de D. João V, o Tratado de Madrid de 1750, estabeleceu as fronteiras modernas do Brasil. Vestígios do seu tempo no Brasil são cidades como Ouro Preto, então a capital do distrito do ouro das Minas Gerais, São João del-Rei, assim nomeada em sua honra, Mariana, que recebeu o nome da rainha, São José, a que foi dada o nome do príncipe herdeiro (hoje Tiradentes), e numerosas outras cidades, igrejas e conventos da era colonial.

José Saramago

Filho e neto de camponeses, José Saramago nasceu na aldeia de Azinhaga, província do Ribatejo, no dia 16 de Novembro de 1922, se bem que o registo oficial mencione como data de nascimento o dia 18. Os seus pais emigraram para Lisboa quando ele não havia ainda completado dois anos. A maior parte da sua vida decorreu, portanto, na capital, embora até aos primeiros anos da idade adulta fossem numerosas, e por vezes prolongadas, as suas estadas na aldeia natal.
Fez estudos secundários (liceais e técnicos) que, por dificuldades económicas, não pôde prosseguir. O seu primeiro emprego foi como serralheiro mecânico, tendo exercido depois diversas profissões: desenhador, funcionário da saúde e da previdência social, tradutor, editor, jornalista. Publicou o seu primeiro livro, um romance,  Terra do Pecado, em 1947, tendo estado depois largo tempo sem publicar (até 1966). Trabalhou durante doze anos numa editora, onde exerceu funções de direcção literária e de produção. Colaborou como crítico literário na revista  Seara Nova. Em 1972 e 1973 fez parte da redacção do jornal Diário de Lisboa, onde foi comentador político, tendo também coordenado, durante cerca de um ano, o suplemento cultural daquele vespertino.
Pertenceu à primeira Direcção da Associação Portuguesa de Escritores e foi, de 1985 a 1994, presidente da Assembleia Geral da Sociedade Portuguesa de Autores. Entre Abril e Novembro de 1975 foi director-adjunto do jornal  Diário de Notícias. A partir de 1976 passou a viver exclusivamente do seu trabalho literário, primeiro como tradutor, depois como autor. Casou com Pilar del Río em 1988 e em Fevereiro de 1993 decidiu repartir o seu tempo entre a sua residência habitual em Lisboa e a ilha de Lanzarote, no arquipélago das Canárias (Espanha). Em 1998 foi-lhe atribuído o Prémio Nobel de Literatura.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Paralelo entre Tempo da História e o Tempo da Escrita da obra "Felizmente há Luar!"

Revolução Francesa de 1789 e invasões napoleónicas levam Portugal à indecisão entre os aliados e os franceses. Para evitar a rendição, D. João V foge para o Brasil. Depois da 1ª invasão, a corte pede a Inglaterra, um oficial para reorganizar o exército: General Beresford Luís de Sttau Monteiro denuncia a opressão vivida na época em que escreve esta obra, isto é, em 1965, durante a ditadura de Salazar. Assim, o recurso à distanciação histórica e à descrição das injustiças praticadas no início do século XIX, permitiu-lhe, também, colocar em destaque as injustiças do seu tempo.
   
A obra "Felizmente há luar" é uma peça épica, inspirada na teoria marxista, que apela à reflexão, não só no quadro da representação, como também na sociedade em que se insere. O teatro de Brecht pretende representar o mundo e o homem em constante evolução de acordo com as relações sociais. Estas características afastam-se da concepção do teatro aristotélico que pretendia despertar emoções, levando o espectador a identificar-se com o herói. 
   
O teatro moderno tem como preocupação fundamental levar os espectadores a pensar, a reflectir sobre os acontecimentos passados e a tomar posição na sociedade em que se insere. Surge assim a técnica do distanciamento que propõe um afastamento entre o actor e a personagem e entre o espectador e a história narrada, para que, de uma forma mais real e autêntica possam fazer juízos de valor sobre o que está a ser representado. Luís Sttau Monteiro pretende, através da distanciação, envolver o espectador no julgamento da sociedade, tomando contacto com o sofrimento dos outros. 
   Deste modo o espectador deve possuir um olhar crítico para melhor se aperceber de todas as formas de injustiça e opressões.

Elementos Simbólicos da obra "Felizmente há Luar!"

Saia verde: A saia encontra-se associada à felicidade e foi comprada numa terra de liberdade: Paris. , no Inverno, com o dinheiro da venda de duas medalhas. "alegria no reencontro"; a saia é uma peça eminentemente feminina e o verde encontra-se destinado à esperança de que um dia se reponha a justiça.  Sinal do amor verdadeiro e transformador, pois Matilde, vencendo aparentemente a dor e revolta iniciais, comunica aos outros esperança através desta simples peça de vestuário. O verde é a cor predominante na natureza e dos campos na Primavera, associando-se à força, à fertilidade e à esperança.

Título: duas vezes mencionado, inserido nas falas das personagens (por D.Miguel, que salienta o efeito dissuador das execuções e por Matilde, cujas palavras remetem para um estímulo para que o povo se revolte).

A luz: como metáfora do conhecimento dos valores do futuro (igualdade, fraternidade e liberdade), que possibilita o progresso do mundo, vencendo a escuridão da noite (opressão, falta de liberdade e de esclarecimento), advém quer da fogueira quer do luar. Ambas são a certeza de que o bem e a justiça triunfarão, não obstante todo o sofrimento inerente a eles. Se a luz se encontra associada à vida, à saúde e à felicidade, a noite e as trevas relacionam-se com o mal, a infelicidade, o castigo, a perdição e a morte. A luz representa a esperança num momento trágico.

Noite: mal, castigo, morte, símbolo do obscurantismo

Lua: simbolicamente, por estar privada de luz própria, na dependência do Sol e por atravessar fases, mudando de forma, representa: dependência, periodicidade. A luz da lua, devido aos ciclos lunares, também se associa à renovação. A luz do luar é a força extraordinária que permite o conhecimento e a lua poderá simbolizar a passagem da vida para a morte e vice-versa, o que aliás, se relaciona com a crença na vida para além da morte. 

Luar: duas conotações: para os opressores, mais pessoas ficarão avisadas e para os oprimidos, mais pessoas poderão um dia seguir essa luz e lutar pela liberdade.

Fogueira: D. Miguel Forjaz – ensinamento ao povo; Matilde – a chama mantém-se viva e a liberdade há-de chegar.
O fogo é um elemento destruidor e ao mesmo tempo purificador e regenerador, sendo a purificação pela água complementada pela do fogo. Se no presente a fogueira se relaciona com a tristeza e escuridão, no futuro relacionar-se-á com esperança e liberdade.

Moeda de cinco reis: símbolo do desrespeito que os mais poderosos mantinham para com o próximo, contrariando os mandamentos de Deus.

Tambores: símbolo da repressão sempre presente.

Significado do título de "Felizmente há Luar!"

O título da peça aparece duas vezes ao longo da peça, ora inserido nas falas de um dos elementos do poder – D. Miguel – ora inserido na fala final de Matilde. Em primeiro lugar é curioso e simbólico o facto de o título coincidir com as palavras finais da obra, o que desde logo lhe confere circularidade. 

1) Página 131 – D. Miguel: salientando o efeito dissuasor das execuções, querendo que o castigo de Gomes Freire se torne num exemplo;

2) Página 140 – Matilde: na altura da execução são proferidas palavras de coragem e estímulo, para que o povo se revolte contra a tirania;

   Num primeiro momento, o título representa as trevas e o obscurantismo; num segundo momento, representa a caminhada da sociedade em busca da liberdade.

   Como facilmente se constata a mesma frase é proferida por personagens pertencentes a mundos completamente opostos: D. Miguel, símbolo do poder, e Matilde, símbolo da resistência e do antipoder. Porém o sentido veiculado pelas mesmas palavras altera-se em virtude de uma afirmação dar lugar a uma eufórica exclamação
   1) Para D. Miguel, o luar permitiria que as pessoas vissem mais facilmente o clarão da fogueira, isso faria com que elas ficassem atemorizadas e percebessem que aquele é o fim ultimo de quem afronta o regime. A fogueira teria um efeito dissuasor.
   2) Para Matilde, estas palavras são fruto de um sofrimento interiorizado reflectido, são a esperança e o não conformismo nascidos após a revolta, a luz que vence as trevas, a vida que triunfa da morte. A luz do luar (liberdade) vencerá a escuridão da noite (opressão) e todos poderão contemplar, enfim, a injustiça que está a ser praticada e tirar dela ilações.

Há que imperiosamente lutar no presente pelo futuro e dizer não à opressão e falta de liberdade, há que seguir a luz redentora e trilhar um caminho novo.

Espaço e Tempo da obra "Felizmente ao luar"

Espaço:
 - Espaço físico: a acção desenrola-se em diversos locais, exteriores e interiores, mas não há nas indicações cénicas referência a cenários diferentes;

 - Espaço social: meio social em que estão inseridas as personagens, havendo vários espaços sociais, distinguindo-se uns dos outros pelo vestuário e pela linguagem das várias personagens;

Tempo:
 - Tempo histórico: século XIX;
 - Tempo da escrita: 1961, época dos conflitos entre a oposição e o regime salazarista;
 - Tempo da representação: 1h30m/2h;
 - Tempo da acção dramática: a acção está concentrada em 2 dias;
- Tempo da narração: informações respeitantes a eventos não dramatizados, ocorridos no passado, mas importantes para o desenrolar da acção.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

General Humberto Delgado



Humberto da Silva Delgado (Torres NovasBrogueiraBoquilobo,15 de Maio de 1906 — Villanueva del Fresno13 de Fevereiro de 1965) foi um militar português da Força Aérea que corporizou o principal movimento de tentativa de derrube do regime salazarista através de eleições, tendo contudo sido derrotado nas urnas, num processo eleitoral fraudulento que deu a vitória ao candidato do regime vigente, Américo Tomás.
-Em 1941 assumiu publicamente as suas simpatias para com a Alemanha Nazi, publicando dois artigos na Revistas Ar onde afirmou: “O ex-cabo, ex-pintor, o homem que não nasceu em leito de renda amolecedor, passará à História como uma revelação genial das possibilidades humanas no campo político, diplomático, social, civil e militar, quando à vontade de um ideal se junta a audácia, a valentia, a virilidade numa palavra.
-Representou Portugal nos acordos secretos com o Governo Inglês sobre a instalação das Bases Aliadas nos Açores durante a Segunda Guerra Mundial.
-Em 1944 foi nomeado Director do Secretariado da Aeronáutica Civil.
-Entre 1947 e 1950 representou Portugal na Organização da Aviação Civil Internacional, sediada em Montreal, Canadá.
-Foi Procurador à Câmara Corporativa (V Legislatura) entre 1951 e 1952.
-Em 1952 foi nomeado adido militar na Embaixada de Portugal em Washington e membro do comité dos Representantes Militares da NATO. Promovido a general na sequência da realização do curso de altos comandos, onde obteve a classificação máxima, passa a Chefe da Missão Militar junto da NATO.
-Regressado a Portugal foi nomeado Director-Geral da Aeronáutica Civil.